Nostalgia

Hoje descobri-me humana. Fiquei sabendo, nas páginas de um velho livro, no corredor vazio, na sala de estar sem seu cheiro, que sinto sua falta. Pode se admirar: consegui sentir alguma coisa. Coisa que só pode ser definida por essa palavra indefinida. Foi como se sua ausência fosse mais sentida do que sua presença. Como se as paredes fossem ocas e, por causa disso, o silêncio ecoasse alto, num bate-e-volta ensurdecedor, que incomoda, que machuca. Sua ausência é assim: silenciosa e cruel.

Hoje, como nunca havia feito, acabei de vez com tudo que não me deixava enxergar. Resolvi prestar atenção no óbvio, que tanto esforço fiz para esconder de mim mesma. Ao despertar foi que percebi tudo isso. Ao sentir o rasgo enorme no peito foi que entendi o que havíamos feito. Eu sei, muito tempo se passou. Você sabe, costumo não pensar nas decisões só para evitar arrependimentos. Maldita hora que fui acordar. Maldita hora que fui olhar ao meu redor. Maldita hora que você foi embora.

Não existe mais nenhum porta-retrato com uma foto sua sorrindo distraidamente. Não existe mais seu perfume escondido atrás dos livros na estante, aquele que eu roubava para enganar a saudade. As lembranças? Nem me fale. Essas joguei no lixo há muito tempo, mas são teimosas como você: elas voltam. E voltam pra atordoar.

Foi quando também percebi uma coisa. Você nunca vai voltar. Certamente já queimou todas cartas, fotos e o que restava do que costumávamos chamar de “nós”. Provavelmente voltou para sua vida de festeiro, já deve estar com outro alguém. Com certeza, você levou a sério quando falei para que saísse da minha vida. Só que sou boba, ainda acho que não é tarde para retirar o que eu falei.

   Só queria novamente nós. Nós tal dia. Nostalgia.