Cada vez mais gostamos de nos trancar: preferimos fechar as
janelas pra não sentir o cheiro da cidade, optamos por sair de carro ao invés
de caminharmos um pouco, quando a chuva cai nós corremos porque ela é poluída
demais, gelada demais, molhada demais. Dizemos que não temos preconceitos, mas
quando vemos alguém maltrapilho e sujo, já temos um estereótipo formado e não
evitamos atravessar a rua. Fingimos que não vemos moradores de rua porque somos
hipersensíveis e, se não vermos, não sentimos. Ignoramos as mazelas da
sociedade decadente. Fingimos que o mundo é cor-de-rosa e que todas as pessoas
têm as mesmas oportunidades.
Bandido tem que ir pra cadeia, uns dizem. Ladrão tem que
morrer, outros alegam. Seriam “eles” pessoas sem ninguém? Não possuem filhos,
mães e pais desamparados. Não são eles essenciais na vida de alguém? Não são
eles seres humanos assim como nós? E porque quando nos referimos a eles, os
chamamos de “eles”? Por que separamos eles de nós? Seriam “eles” de outra
espécie? Outra espécie tão agressiva que merece viver à margem. Uma espécie tão
selvagem que se é solta mata o primeiro de “nós” que ver. “Eles” são vítimas do
nosso preconceito.
Eles são as pessoas invisíveis. Aquelas que sabemos que estão
ali, que vemos, mas que fingimos que não existem por causa da nossa
hipersensibilidade, a qual substituímos por conformismo. “Eles” são os que
pagam pela corrupção, pela educação que piora exponencialmente, pagam pelas más
condições de vida e pelo preconceito de gente sem ninguém. São jogados em
abrigos, em lugares onde só apanham mais e mais. Levam tapas na cara todos os
dias e “nós” queremos que eles sejam felizes como somos, queremos que eles
cresçam e sejam pessoas de bem e que amem a pátria. “Nós” somos hipócritas.
Nós julgamos o assaltante do ônibus, o homicida menor de
idade, o ladrão do supermercado. Porém, esquecemos a nossa parcela de culpa.
Esquecemos que separamos “nós” e “eles” e, uma vez que eles não são aceitos
pelo nosso meio, lutam para sobreviver do jeito que conseguem. Submetem-se ao
que não queriam apenas para ver o sol nascer no dia seguinte. Eles querem
atenção: cada assalto, cada ato de violência é um grito desesperado dessa
sociedade esquecida. Eles clamam por alguém que os compreenda, clamam por
mudança. Mas o grito sai fraco, porque “eles” já não têm mais voz. Porque
“eles” foram “enjaulados” em lugares com capacidade para 10 pessoas, mas têm 40
colegas de cela. Foram escorraçados dos seus lares, ignorados por “nós” e
tiveram que se contentar com essa vida. Nem por isso eles deixam de gritar.
Só que na realidade os verdadeiros enjaulados somos nós.
Estamos presos aos nossos estereótipos, ao nosso mundo utópico em que todas as
pessoas têm o direito de serem felizes, menos eles. Estamos literalmente
encarcerados ao redor de preceitos que ninguém segue, ao redor de ilusões nas
quais todos acreditam. Aprendemos desde pequenos que não se fala com estranhos,
não se dá esmola para mendigo, que se fecha o vidro do carro no engarrafamento,
partindo do pressuposto de que todos “eles” são iguais. E esquecemos que eles
só queriam ter a chance que não tiveram ou que lhes foi tirada. Esquecemos que,
muitas vezes, a opção não foi deles e mesmo assim julgamos sem perceber.
Precisamos abrir os olhos e enxergar o invisível – as pessoas invisíveis.
Precisamos começar a ouvir o clamado que nos é dirigido todos os dias, mas que
estamos enjaulados em nós mesmos para compreendermos.
Artigo publicado no jornal O Correio do dia 03 de junho de 2013.
Cara Taísa,
ResponderExcluirSeu texto está no nível: Brilhante! Parabéns!
"Revolução poética" ou "poética revolução"!
Um abraço
Johnny Santos
Johnny,
ExcluirFico muito agradecida pelo seu comentário. Obrigada pela visita, volte sempre!
Olá querida , tudo bem ?
ResponderExcluirhá é a primeira vez que visito seu bloguinho e adorei as postagem e principalmente o lay *.*
Concerteza seu blog ja é um dos meus faavoritos , alias ja estou seguindo se puder seguir o meu de volta ficarei bem feliz e agradecida , espero sua visitinha por lá !
bgs
Katharine Santos
http://party-fucking.blogspot.com.br/