Naquela manhã
cinza, o céu se vestiu de verde. Os clichês apareciam por entre as árvores e as
expressões nos rostos confusos da multidão que corria pelas ruas só demonstravam
o caos de uma cidade em que não se ouve nem os próprios pensamentos. A mulher,
atordoada com seus muitos celulares que se perdiam dentro da bolsa enquanto
vibravam e dançavam ao som da música que anunciava alguém a sua procura. Estava
enlouquecendo. Havia dias que não parava, que não sentava a espreita no
parapeito da janela e trocava olhares com o vizinho de prédio sem querer. Havia
dias que não se importava mais com a previsão do tempo, com as notícias do dia,
com o jantar saudável, com as amigas. Havia dias que deixava o acaso lhe guiar.
Havia dias que não havia mais dias. Somente correria, pressa, necessidade de
uma ocupação, caso contrário morreria. De tédio. Por simplesmente estar vivendo
com calma.
Dentro do
carro, em meio ao transito caótico que lhe dava bom dia todas as manhãs,
atendia o celular e imediatamente o outro já lhe chamava com mais urgência
ainda. E buzinas. Choro de criança vindo do carro ao lado. Vendedores de rua
batendo em seu vidro. Pensamentos. Ecoando. Numa velocidade maior que a de um
locutor de rádio acompanhando a trajetória do jogador de futebol prestes a
fazer um gol, seus pensamentos urgiam. Repentinamente, o mundo pintou-se de
preto. E tudo foi ficando tão longe, tão longe.
Por um momento
tudo ficou calmo: sua lista de afazeres havia diminuído consideravelmente. Uma
tempestade tomava conta da cidade, por isso ninguém saía de suas casas. Um
tempo para viver com calma.
“Ei moça!”,
gritou um dos vendedores que batia em seu vidro. “Acho que você apagou aí.
Acorda, a vida continua.”
E ela, sem nem
saber onde estava, sorriu. Porque foi lembrada. Porque sabia que não era
invisível, porém almejava ser. Segurou no volante e seguiu em frente. Já não
lembrava mais para onde estava indo, só sabia que precisava fazer alguma
coisa. De preferência viver um pouco
mais.
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